top of page

Angola: Do Início da Revolta em 1961 ao Colapso da União Soviética – Um Contexto Geopolítico e Histórico Profundo

há 3 dias

9 min de leitura

1

4

0

Introdução

A história de Angola desde 1961 até o fim da Guerra Fria é um relato multifacetado de revolta colonial, intervenções estrangeiras e confrontos ideológicos que se entrelaçaram para transformar o país em um campo de batalha essencial para o desenrolar das tensões globais entre as superpotências. Este artigo traça em detalhes a cronologia dos principais eventos que fizeram de Angola não apenas um teatro de guerra civil, mas também uma peça central no declínio da União Soviética. Através da análise de documentos desclassificados da CIA e arquivos do National Security Archive, revisaremos como o envolvimento da União Soviética e outras potências globais afetou Angola e contribuiu para o desgaste do poder soviético.


1. O Início da Luta por Independência (1961-1975)


A Guerra de Independência de Angola começou oficialmente em 1961, com os movimentos nacionalistas angolanos emergindo em resposta ao domínio colonial português. Grupos como o MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), o FNLA (Frente Nacional de Libertação de Angola) e mais tarde a UNITA (União Nacional para a Independência Total de Angola) foram os protagonistas principais desta resistência. O ataque em 4 de fevereiro de 1961, que marcou o início dos combates armados, visava instalações militares e prisionais em Luanda, e foi o primeiro passo significativo na luta contra o colonialismo português ​(CIA)​(CIA).


Durante essa fase inicial, o MPLA começou a alinhar-se com as forças comunistas, obtendo o apoio da União Soviética, enquanto os Estados Unidos, temendo o avanço do comunismo, viram no FNLA e na UNITA possíveis aliados para conter a expansão soviética no continente africano. Portugal, sob o regime autoritário do Estado Novo, permaneceu fortemente contrário a qualquer concessão de independência, intensificando o conflito.

A guerra colonial era também parte de um esforço mais amplo de descolonização africana que envolvia Moçambique e Guiné-Bissau. A ONU desempenhou um papel importante na condenação das ações portuguesas, embora a real efetividade da organização em pressionar Portugal tenha sido limitada pela complexa dinâmica da Guerra Fria ​(National Security Archive).


2. A Revolução dos Cravos e o Impacto na Descolonização (1974-1975)


O regime de Salazar em Portugal foi derrubado por um golpe militar pacífico em 1974, conhecido como a Revolução dos Cravos. O novo governo português estava ansioso para encerrar suas guerras coloniais e iniciou o processo de descolonização em Angola. No entanto, a retirada portuguesa em 1975 abriu caminho para uma nova fase de conflito: a guerra civil angolana. A luta pelo controle de Angola pós-independência entre o MPLA, FNLA e UNITA rapidamente se tornou uma extensão da Guerra Fria global​ (National Security Archive).


Neste ponto, o MPLA assumiu o controle de Luanda e declarou-se o governo legítimo de Angola, com Agostinho Neto à frente, sendo rapidamente reconhecido pela União Soviética e Cuba. Os Estados Unidos e a África do Sul, por outro lado, apoiaram a UNITA, liderada por Jonas Savimbi, e o FNLA, liderado por Holden Roberto, como uma forma de conter o avanço do comunismo no país. Documentos desclassificados mostram que a CIA ajudou a fornecer armas e apoio logístico para os inimigos do MPLA, enquanto o apoio militar cubano se tornou essencial para a sobrevivência do MPLA no poder​ (National Security Archive)​(National Security Archive).


3. O Papel das Superpotências na Guerra Civil Angolana (1975-1989)


A intervenção direta da União Soviética e de Cuba em Angola, após 1975, marcou uma escalada significativa do conflito. O MPLA, liderado por Agostinho Neto e, mais tarde, por José Eduardo dos Santos, dependia fortemente da assistência soviética em termos de armamentos, conselheiros militares e suporte financeiro. Ao mesmo tempo, os EUA, seguindo a lógica da Guerra Fria, viam a presença comunista em Angola como uma ameaça à segurança estratégica de toda a África Subsaariana. A África do Sul também entrou diretamente no conflito, combatendo as forças do MPLA com o apoio da UNITA, temendo que um governo comunista em Angola desestabilizasse a África do Sul ​(National Security Archive)​(CIA).


Os documentos desclassificados da CIA revelam a amplitude do envolvimento soviético e cubano no conflito, com mais de 36.000 soldados cubanos em Angola no final dos anos 1970, apoiando o exército do MPLA. Ao mesmo tempo, o suporte da CIA aos rebeldes da UNITA e do FNLA continuou em segredo, com Henry Kissinger, secretário de Estado dos EUA, admitindo em conversas desclassificadas o apoio indireto dos EUA às operações da África do Sul em Angola ​(National Security Archive).


A ONU tentou várias vezes intervir e mediar uma solução pacífica para o conflito, passando resoluções que condenavam a presença de tropas estrangeiras e pedindo a retirada das forças sul-africanas. No entanto, as superpotências, utilizando Angola como uma proxy war, dificultaram qualquer progresso diplomático efetivo ​(National Security Archive).


4. A Carga Econômica para a União Soviética e o Declínio do Comunismo


O envolvimento da União Soviética em Angola foi parte de uma estratégia mais ampla de expansão do socialismo na África. No entanto, a guerra civil angolana, somada à intervenção soviética no Afeganistão, começou a sobrecarregar os recursos soviéticos. Documentos da CIA e do National Security Archive indicam que o fornecimento de armamentos, treinamento e o suporte financeiro massivo para o MPLA começaram a drenar as finanças soviéticas, com a guerra de Angola sendo vista como um investimento de retorno duvidoso ​(CIA)​(National Security Archive).


Ao longo da década de 1980, a União Soviética entrou em uma fase de declínio econômico e político, com Mikhail Gorbachev introduzindo as políticas de Perestroika e Glasnost na tentativa de reformar o sistema. No entanto, o envolvimento contínuo em conflitos caros como Angola foi um dos fatores que contribuiu para a dissolução da União Soviética em 1991. A Guerra Civil Angolana continuou até 2002, mas já em 1989, o apoio soviético ao MPLA começou a diminuir, deixando o regime de José Eduardo dos Santos à deriva em um cenário pós-Guerra Fria ​(National Security Archive)​(National Security Archive).


5. O Cenário Angolano nos Anos 80: Conflito Prolongado e Esgotamento das Superpotências


A década de 1980 foi marcada por uma intensificação dos conflitos em Angola, à medida que o MPLA, sob o governo de José Eduardo dos Santos, continuava a se consolidar no poder com o apoio contínuo da União Soviética e de Cuba. No entanto, a guerra civil angolana tornou-se uma batalha sem fim, desgastando não apenas os recursos internos de Angola, mas também drenando as finanças e a capacidade militar das potências estrangeiras envolvidas.


Os documentos desclassificados mostram que, em meados dos anos 80, a União Soviética estava cada vez mais pressionada pela combinação de múltiplos conflitos internacionais e sua própria crise econômica interna. A presença de tropas cubanas, que no auge chegaram a mais de 50.000 soldados em Angola, foi financiada e mantida com suporte logístico soviético, algo que foi tornando-se insustentável​ (National security Archive)​(National Security Archive).


Ao mesmo tempo, o Ocidente, liderado pelos Estados Unidos, intensificou seu apoio à UNITA, utilizando a África do Sul como um intermediário militar. A CIA, como revelam documentos desclassificados, continuou a canalizar apoio secreto a Jonas Savimbi, tentando equilibrar o poder no terreno, o que prolongou ainda mais o conflito e gerou uma espiral de destruição que deixou Angola devastada ​(CIA)​(National Security Archive).


A ONU, durante esse período, lutou para mediar uma paz duradoura. Resoluções foram aprovadas condenando a presença sul-africana e cubana, mas os esforços diplomáticos muitas vezes esbarravam no impasse ideológico da Guerra Fria, com as superpotências utilizando o território angolano como um campo de batalha indireto ​(National Security Archive)​(National Security Archive).


6. As Consequências para a União Soviética: O Colapso de uma Superpotência


À medida que a década de 1980 avançava, ficou claro que o envolvimento da União Soviética em Angola era parte de um padrão mais amplo de superextensão imperial que incluía também a intervenção no Afeganistão e o suporte a diversos movimentos revolucionários ao redor do mundo. As tensões econômicas internas, exacerbadas pelas campanhas militares dispendiosas, começaram a corroer a estrutura da União Soviética.


Documentos da CIA e relatórios de inteligência desclassificados mostram que, à medida que Mikhail Gorbachev assumiu o controle do Kremlin em 1985, as políticas de Perestroika e Glasnost trouxeram uma nova abordagem para os compromissos estrangeiros. Gorbachev começou a reduzir o apoio soviético aos aliados, priorizando reformas domésticas e buscando melhorar as relações com o Ocidente​ (National Security Archive)​(CIA).


Em 1988, Gorbachev anunciou a retirada das tropas cubanas e a redução do envolvimento soviético em Angola, marcando uma guinada nas políticas externas de Moscou. Esta decisão foi vista como uma admissão de que o envolvimento prolongado em Angola era insustentável tanto do ponto de vista militar quanto econômico. A retirada das tropas cubanas, que foi negociada em conjunto com a resolução do conflito na Namíbia, foi um dos primeiros sinais tangíveis do enfraquecimento do poder soviético no cenário global​ (National Security Archive)​(CIA).


Com o colapso da União Soviética em 1991, o governo do MPLA perdeu seu principal patrocinador ideológico e financeiro, forçando o governo angolano a buscar novas formas de estabilização política e econômica. No entanto, a guerra civil angolana continuaria até 2002, alimentada por outros fatores internos, como a luta pelo controle dos recursos naturais, especialmente petróleo e diamantes ​(CIA)​(National Security Archive).


7. A Resolução do Conflito e o Fim da Guerra Civil (1991-2002)


Com o fim da Guerra Fria, o cenário geopolítico de Angola mudou drasticamente. A dissolução da União Soviética e o enfraquecimento do suporte militar e financeiro externo forçaram as partes envolvidas no conflito a reconsiderar suas estratégias. Sem o apoio consistente de uma superpotência, o MPLA iniciou esforços de negociação com a UNITA, embora a guerra ainda tivesse momentos de alta intensidade até o assassinato de Jonas Savimbi, em 2002, que finalmente trouxe um fim ao conflito armado.


Durante os anos 1990, a ONU desempenhou um papel mais ativo na facilitação de diálogos e na imposição de sanções às facções armadas, particularmente à UNITA, que passou a depender do comércio ilegal de diamantes para financiar suas operações militares. A intervenção diplomática internacional, agora desvinculada da dinâmica da Guerra Fria, foi mais eficaz em promover um acordo de paz ​(National Security Archive

)​(National Security Archive).


Em abril de 2002, após décadas de guerra, Angola finalmente alcançou a paz com a assinatura do Protocolo de Luena, que selou o fim formal da guerra civil. Este acordo marcou o início de um processo de reconstrução e reconciliação nacional, ainda que o país permanecesse profundamente marcado pelas cicatrizes do conflito ​(National Security Archive).


Conclusão: Angola e o Fim da Guerra Fria


O envolvimento de Angola na Guerra Fria, desde os primeiros movimentos de independência em 1961 até o fim da guerra civil em 2002, foi um reflexo das tensões globais entre as superpotências. A participação da União Soviética no apoio ao MPLA e a intervenção dos Estados Unidos e da África do Sul em apoio à UNITA fizeram de Angola um campo de batalha indireto, mas crucial, na luta ideológica entre comunismo e capitalismo.


À medida que a União Soviética se afundava em crises econômicas e políticas internas, seu envolvimento em Angola se tornou um símbolo do declínio do poder soviético. O colapso da URSS em 1991 deixou o MPLA sem seu principal aliado, mas também abriu caminho para uma nova ordem mundial em que as resoluções de conflitos regionais começaram a ser abordadas com uma perspetive mais multilateral.


Angola, com sua riqueza em recursos naturais e sua importância estratégica na África, permanece um exemplo vívido de como conflitos locais podem ser amplificados por interesses globais e como esses mesmos conflitos podem ter repercussões globais significativas. Hoje, a história de Angola durante a Guerra Fria serve como um lembrete das consequências duradouras da intervenção estrangeira e da guerra prolongada.


Fontes Citadas:

  1. CIA FOIA – "Declassified Intelligence Analyses on the Soviet Union Produced by CIA's Directorate of Intelligence" (CIA)ps://www.cia.gov/readingroom/collection/declassified-intelligence-analyses-former-soviet-union-​(National Security Archive)ias-directorate).

  2. National Security Archive – "Secr​(National Security Archive) Documents on History of Africa Involvement" Link.

  3. National Security Archive – "The Gorbachev File" Link.

Esta imagem simboliza a luta e resiliência de Angola durante o período de 1961 até a queda da União Soviética. O mapa de Angola, com rachaduras e sombras, reflete as divisões e os conflitos que marcaram essa época.

Elementos abstratos ao redor do mapa simbolizam as riquezas naturais de Angola, como diamantes e petróleo, enquanto rostos sutis representam as pessoas que viveram essa história. Apesar das cores sombrias, raios de luz emergem, simbolizando esperança e a resiliência do povo angolano.

Esta imagem captura a jornada geopolítica e histórica de Angola desde 1961 até a queda da União Soviética. Ela mistura os elementos-chave do conflito militar, as tensões da Guerra Fria e a influência das superpotências. O envolvimento das forças soviéticas e cubanas é representado ao lado dos capacetes azuis da ONU, simbolizando os esforços de paz.

Os recursos naturais de Angola, como o petróleo e os diamantes, também estão presentes, refletindo a exploração econômica que impulsionou o conflito.

O martelo e a foice soviéticos, rachando e fragmentando, indicam o declínio da influência da União Soviética, enquanto os soldados e helicópteros acima remetem ao papel central de Angola como campo de batalha durante esse período. A imagem simboliza as dinâmicas complexas e os interesses diversos que moldaram essa era turbulenta.


há 3 dias

9 min de leitura

1

4

0

Comentários

Share Your ThoughtsBe the first to write a comment.
bottom of page