Explorando a Rica Cultura de Angola e Portugal

Vida Interrompida: Filhos de Terras Longe
0
1
0
Memórias e Heranças do Êxodo Angolano de 1975
1. Introdução e Contexto Histórico
Nasci em Santa Comba (hoje Waku Kungo) a 13 de fevereiro de 1959, num período em que Angola foi elevada ao estatuto de Província Ultramarina de Portugal em 1951, iniciado pela política do Estado Novo que visava integrar o território colonial como parte orgânica do império WikipediaWikipedia.
Nesse contexto, ergueram-se grandes obras públicas como a Barragem de Cambambe, inaugurada em 1963 para fornecer energia ao corredor ferroviário de Benguela e a Luanda Wikipedia, e modernizaram-se troços essenciais da rede rodoviária nacional, reduzindo significativamente o tempo de transporte das colheitas até ao Porto do Lobito Encyclopedia Britannica.
O meu pai, João de Deus Chaves, destacou-se como empreendedor local: era proprietário de uma mercearia geral e de um camião de carga que servia aldeias vizinhas e se juntou aos primeiros 31 portugueses convidados a “desbravar a mata”, participando na construção do hospital municipal, de pontes e das escolas primárias da região Elmirochaves.
Recordo-me de tardes em que nuvens carregadas se aproximavam como exércitos em marcha e, num instante, a terra quente transformava-se em lama, encharcando os cadernos na saída da Escola de Cela — um fenómeno que marcou gerações e inspirou o famoso conselho do Professor Bento: “Se a chuva levou as vossas palavras, escrevam-nas outra vez. E com mais alma.” Elmirochaves.
Após a tempestade, os cadernos secavam nos parapeitos abertos como asas de borboleta, enquanto nós, tal como eles, voltávamos a abrir-nos ao mundo, manchados mas determinados a refazer as nossas histórias Elmirochaves.
Essa coragem estava enraizada no exemplo dos pioneiros que, além de desbravarem a mata, instalaram canais de irrigação e ergueram pontes sobre riachos sazonais, transmitindo conhecimentos agrícolas e de engenharia à comunidade local Elmirochaves.
Em casa, a avó, vinda dos Açores, mantinha viva a tradição do pão de massa-mãe que fermentava sob o calor húmido das manhãs tropicais, reunindo vizinhos na varanda para partilhar cheiros e sabores que evocavam a terra que amávamos Elmirochaves.
A minha formação académica decorreu na Escola Industrial e Comercial Narciso do
Espírito Santo, onde aprendi que infraestruturas — estradas, pontes e edifícios — são, acima de tudo, redes de confiança que sustentam uma comunidade Elmirochaves.
Este conjunto de experiências — da transformação económica promovida pelo Província Ultramarina às memórias de chuva, de pão caseiro e de caminhões de construção — formou o alicerce da identidade da nossa família e continua a inspirar os meus escritos em elmirochaves.com, celebrando o legado de quem, em terras longe, mantém viva a esperança de um regresso Encyclopedia Britannica.
2. As Raízes em Angola
Cresci nas encostas de Santa Comba, onde a terra argilosa e vermelha guardava a humidade das chuvas tropicais e permitia a instalação de canais de irrigação rudimentares escavados pelos primeiros pioneiros portugueses que vieram desbravar a mata. Eram valas estreitas, alinhadas por margens de madeira, que conduziam a água dos riachos sazonais até às zonas de cultivo de café, milho e feijão-frade. Cada manhã, os homens partiam antes do sol nascer para abrir comportas de madeira e verificar a pressão do fluxo, garantindo que as plantas recebiam vida suficiente sem causar erosão dos taludes.
Naqueles campos, vi nascer a sementeira que sustentava famílias inteiras. Crianças — tal como eu — seguiam os adultos em passo miúdo, aprendendo a distinguir o passo cadenciado dos trabalhadores agrícolas, o som ritmado das máquinas de debulhar café e o crepitar das folhas secas sob os pés descalços. Nos bancos improvisados à sombra dos cajueiros, escutávamos histórias dos mais velhos sobre como uma única mangueira, carregada de frutos perfumados, podia alimentar uma família inteira durante dias.
As pontes iniciais eram simples troncos apoiados em engradados de pedra, posicionados sobre pequenos riachos. Cada vez que o “camião de carga” do meu pai aparecia ao longe — o símbolo de progresso — reuníamos coragem para atravessá-las; o motor rugia, levantava pó vermelho e ecoava pelas margens, anunciando a chegada de brita, cimento e madeira. Foi graças a esse camião que as primeiras escolas primárias, construídas em casas de taipa reforçada e cobertura de telha colonial, passaram a acolher miúdos vindos de aldeias vizinhas. Hoje, essas mesmas escolas ainda resistem, testemunhas silenciosas de uma época de esperança e trabalho conjunto.
Entre idas e vindas, a comunidade aprendeu a cuidar dos sistemas de água potável: reparávamos canos improvisados com bambu, substituíamos seções corroídas de metal e adaptávamos filtros de carvão vegetal para remover impurezas. Essa capacidade de adaptação e cooperação, que emergia tanto das romarias de São João como das reuniões na mercearia do meu pai, moldou o sentido de solidariedade que carrego até hoje.
Brincávamos durante horas nos campos de terra batida, inventando bancas para vender frutas silvestres, jogando futebol com bolas feitas de trapos e subindo às mangueiras para colher mangas e goiabas. Foi aí que aprendi o valor da criatividade, da confiança mútua e do sorriso fácil, mesmo quando o calor apertava e as nuvens negras de chuva anunciavam outra tempestade que viria molhar nossos cadernos e renovar, ao fim do dia, a nossa sede de recomeço.
Fontes Consultadas (para contexto geral, sem citações diretas)
Waku Kungo Water Project (globalministries.org): detalhes sobre projetos modernos de abastecimento e irrigação em Waku Kungo.
Owini Water Supply Project (owini-water.com): visão geral de esforços de engenharia hídrica na região.
“Small-Scale Irrigation in Angola” (ResearchGate): estudo sobre potencial e desafios da irrigação familiar em Angola.
History of Education in Angola (Wikipedia): enquadramento histórico da evolução escolar no período colonial.
Angolan War of Independence (Wikipedia): contexto das dinâmicas políticas que levaram ao êxodo de 1975.
Agriculture in Angola (Wikipedia): panorâmica da importância agrícola para a economia colonial.
ReliefWeb – Bridge Construction (reliefweb.int): exemplos de construção de pontes rurais em Angola.
International Trade Administration – Angola Agricultural Equipment (trade.gov): informações sobre cultivo e irrigação atuais.
Nenhuma dessas fontes abordou diretamente as memórias pessoais de Santa Comba nem os relatos específicos da “Loja do Pai” ou do “Camião de Carga”, mas serviram para contextualizar o quadro histórico e técnico em torno das práticas agrícolas, hídricas e educacionais daquela época.
3. O Êxodo Forçado
3.1 Presságios de Mudança
Em 1974, as conversas nos cafés de Santa Comba e nas romarias começaram a tingir-se de incerteza. Notícias vindas de Lisboa anunciavam a Revolução dos Cravos, que derrubara o regime do Estado Novo e prometia repensar todo o império ultramarino. Uns sentiam esperança de reformas políticas; outros, receio de desordem e de ingerência externa, sobretudo quando se ventilava a interferência dos blocos da Guerra Fria nos movimentos de libertação africanos. Era comum ver meu pai fechar a mercearia mais cedo, juntar-se às reuniões de produtores agrícolas e discutir, em voz baixa, como proteger as cooperativas de café caso se perdesse o apoio governamental.
3.2 A Partida Precipitada
Em agosto de 1975, a tensão escalou de vez. Tropas irregulares patrulhavam as estradas de terra, e vários amigos portugueses e angolanos com ligações a organizações civis foram alvejados em ataques repentinos. Numa madrugada em que o vento trouxe cheiro de pólvora, acordámos com o ronco de camiões militares a percorrer a EN 100. Em poucas horas, reunimos o essencial: três malas de lona— roupas, fotografias de família e os livros de contabilidade do meu pai, instrumentos vitais para reconstruir o nosso sustento noutra terra. Não houve tempo para abraços demorados nem para despedidas formais: o choro ficou suspenso no ar, misturando-se ao estalar de galhos secos.
3.3 A Travessia e a Chegada
Partimos de Santa Comba ao cair do dia, no crepúsculo que tingia o horizonte de laranja e púrpura. Num cortejo de Automóveis e camionetas abarrotadas de pessoas, seguimos pelas estradas de terra batida envoltas em pó vermelho e de alcatrão, onde cada quilómetro percorrido aumentava o silêncio tenso entre os passageiros. A viagem prolongou-se durante toda a noite, embalados pelo ranger das rodas e pelo farol ocasional das lanternas dos caminhões, enquanto o firmamento estrelado servia de único testemunho ao nosso êxodo.
Ao romper da aurora, chegámos finalmente a Nova Lisboa (atual Huambo). Ainda meio sonolentos, descemos das camionetas e sentimos o cheiro de orvalho misturado ao odor de querosene dos aviões da Cruz Vermelha Internacional que cortavam o céu. No aeródromo, voluntários coordenavam a evacuação num fluxo ordenado: famílias formavam filas diante de velhos DC-3 e C-47 adaptados para civis, e as mochilas apertadas contra o peito pareciam conter não só pertences, mas histórias inteiras.
O embarque seguia num ritmo célere. Em menos de uma hora de voo, sobrevoámos o planalto central, avistando as lonjuras de montanhas recobertas pela savana e, no vale do Kwanza, os primeiros canais de irrigação que tinham sustentado as nossas plantações. Ao aterrar em Luanda, percorremos rapidamente as áreas tomadas por tropas e viaturas militares, mas logo encontramos aviões maiores — Caravelles e Boeing 707 fretados pela Cruz Vermelha — prontos para a ponte aérea até Lisboa.
Naquele último voo, os mais de 6 000 km pareceram comprimir-se em cerca de dez horas de expectativa e emoção. Aterrados em Lisboa debaixo de um céu cinzento e frio, sentimo-nos estrangeiros em terra rara, recebidos por filas de “retornados” cujos olhares, tantos quantos os nossos próprios, procuravam um lar que já não existia.
Ao desembarcar em Lisboa, percebi que a palavra “retornado” era um rótulo frio para quem, como nós, nunca tivera Portugal como lar real. Fomos acolhidos em centros de refugiados improvisados, dormindo em colchões finos e partilhando refeições enlatadas. O sentido de comunidade surgiu novamente, desta vez entre pessoas dispersas de Angola, Moçambique e Guiné. Ainda hoje guardo o cartão plástico com o número de inscrito na Segurança Social, um documento que sintetizava a nossa condição: ex-colonos sem casa e sem certezas, mas unidos pelo mesmo fio invisível de saudade.
4. Memórias e Herança da Saudade
4.1 A Chegada a Los Angeles e a Transferência para Santa Clara
Em 1976, após meses de espera em centros de acolhimento em Lisboa, partimos finalmente de avião rumo a Los Angeles. Assim que atravessámos a alfândega do Aeroporto Internacional de Los Angeles, sentimos uma mistura de alívio e ansiedade: alívio por estarmos livres das incertezas de um abrigo colectivo, e ansiedade por enfrentar um país imenso, com línguas e ritmos que ainda nos eram estranhos. Mal recolhemos as malas, fomos acompanhados por um voluntário até ao portão de embarque para o nosso próximo voo, desta vez com destino a San José, na Califórnia.
O voo de Los Angeles a San José foi curto, mas repleto de expectativas. Lá do alto, pudemos avistar o vasto mosaico urbano do condado de Orange dando lugar, pouco a pouco, à malha de ruas e campi do Vale do Silício. Ao aterrar em San José, foi como se atravessássemos um portal: deixávamos para trás a costa quente e ensolarada do sul da Califórnia para entrar num vale onde, apesar do sol igualmente forte, já sentíamos o pulsar de uma comunidade portuguesa bem organizada.
À saída do pequeno aeroporto regional, familiares oriundos de Santa Clara esperavam-nos com abraços calorosos. Tinham-nos alugado um apartamento próximo do centro histórico de Santa Clara, numa rua ladeada de oliveiras e pinheiros-mansos — um refúgio tranquilo em contraste com o movimento frenético das ligações aéreas. Entrando naquele lar provisório, sentimos a segurança imediata de não estarmos sozinhos: a mobília simples, mas acolhedora, e os utensílios que eles trouxeram connosco desde Angola já dispunham-se em prateleiras com azulejos portugueses, evocando as nossas memórias de casa.
Nos dias que se seguiram, a família apresentou-nos aos vizinhos luso-americanos: idosos açorianos que falavam com sotaque de Ponta Delgada, casais madeirenses que nos convidaram para o café de manhã, jovens descendentes de emigrantes que se ofereciam para nos ajudar a preencher formulários nos serviços públicos. Rapidamente, aprendemos que Santa Clara e seu vizinho San José formavam um dos núcleos mais sólidos da comunidade portuguesa no Vale do Silício, com clubes, sociedades e igrejas que se reuniam para celebrar o Dia de Portugal, as festas do Divino Espírito Santo e outros eventos culturais.
Viver naquele apartamento marcou o início de uma nova etapa: cada canto foi preenchido com os aromas do café coado em pano, dos bolos de chila que a tia trouxe num fim de semana e das canções de saudade que ecoavam entre as paredes. A nossa integração na comunidade luso-americana começou ali — num lar onde o passado angolano encontrava acolhimento nas tradições portuguesas de Santa Clara, lançando as bases para uma vida de dupla pertença.
4.2 A Saudade no Quotidiano
Já instalados em Santa Clara, descobrimos que a nostalgia se manifestava nos pequenos gestos do dia a dia. Todas as manhãs, o ritual do café passado em pano reunia-nos na cozinha do apartamento: o aroma forte e o som do líquido a escorrer faziam-nos viajar de volta às manhãs tropicais de Santa Comba, onde o grão era torrado lentamente, a céu aberto. Entre goles, comentávamos as notícias das igrejas portuguesas locais, comparando-as aos sermões de Nossa Senhora do Rosário que nos lembravam as romarias de infância.
Ao regressar do trabalho, passávamos pela Popular Bakery para comprar pães quentes e pastéis de nata, revivendo o sabor do pão caseiro da avó. Muitas vezes cruzávamo-nos com vizinhos açorianos que nos perguntavam em que freguesia de Portugal vivíamos originalmente — respostas que se perdiam na complexa geografia dos nossos sentimentos, pois “terra-mãe” para nós era tanto Santa Comba como as ilhas dos Açores.
Nas tardes de sábado, juntávamo-nos no SES Hall para praticar o jogo do sueca e ouvir cantares ao desafio. O tilintar das moedas e o ritmo dos acordes de guitarra davam-nos conforto, recordando as conversas ao luar, quando, em Angola, reuníamo-nos na varanda a olhar o céu estrelado. Essas horas de convívio faziam esquecer um pouco o frio californiano, aquecendo-nos com o calor das vozes em português e dos risos partilhados.
Ainda hoje, guardo no bolso do casaco um pedaço de cortiça de rolha de vinho, dado por um amigo madeirense numa festa de São Martinho. Para mim, é um talismã da saudade: sempre que o toco, sinto o calor da terra vermelha, as estradas de terra batida e os risos das crianças correndo entre as mangueiras.
4.3 Transmissão do Legado
Com o passar dos anos, converti a saudade em projeto: ensinei aos meus filhos as receitas de família, desde o caldo verde ao pão de massa-mãe, e gravei em casa canções lusitanas e cânticos quimbundo, para que não se perdesse a musicalidade das línguas de Angola. Aos domingos, a nossa mesa reunia amigos de várias gerações: netos de imigrantes, jovens profissionais portugueses e angolanos recém-chegados, todos atraídos pela hospitalidade típica dos Chaves.
Inscrevi-me como voluntário no Portuguese Historical Museum de San José, documentando histórias de retorno e exílio. Participei em feiras de cultura no History Park, onde mostrei fotografias da “Loja do Café do Pai” e do “Camião de Carga” que ergueram nossas pontes, criando exposições que emocionaram visitantes portugueses e americanos.
Hoje, com netos e bisnetos que cresceram a ouvir falar de “mata”, “camioneta” e “mercearia geral”, vejo que o legado sobrevive: não como saudade dorida, mas como urgência de manter viva a cultura que nos formou. Cada história contada, cada pão coado, cada canção cantada em português europeu ou em quimbundo é uma ponte que liga o passado ao futuro e garante que, em qualquer parte do mundo, um filho de terras longe saiba sempre quem é e de onde vem.
4.4 Envolvimento Comunitário em Santa Clara
Em Santa Clara, a vida comunitária girava em torno de três polos principais: o Portuguese Hall, as paróquias portuguesas e os clubes desportivos. Logo nas primeiras semanas, inscrevemo-nos no SES Hall, onde participávamos nas reuniões do Divino Espírito Santo e aprendíamos danças folclóricas açorianas. As coreografias, executadas em palcos improvisados, uniam gerações: jovens descendentes de imigrantes dividiam-se entre aprender as figuras tradicionais e ensinar passos contemporâneos, criando um verdadeiro intercâmbio cultural.
Nas missas dominicais na Church of the Five Wounds, encontrávamos um misto de portugueses de várias origens — Madeira, Minho, Açores — e luso-angolanos como nós, todos unidos pelo mesmo idioma e pela saudade partilhada. As homilias, ora em inglês, ora em português, lembravam-nos da necessidade de manter viva a nossa fé e as tradições, mesmo num contexto tão diferente daquele que deixáramos em Angola.
Paralelamente, o Casa do Benfica e a Sociedade Filarmónica União Popular organizavam campeonatos de sueca e torneios de futsal, onde o convívio era tão importante quanto a competição. Era comum ver as mesas do bar improvisado cobertas de petiscos portugueses — tremoços, queijos curados, pataniscas de bacalhau — enquanto dois gatos pingados de americanos curiosos assistiam a um jogo que terminava em gargalhadas e apertos de mão calorosos.
Em junho, participávamos nas festas de Santo António, decorando as ruas com manjericos e bandeirinhas, preparando sardinhas assadas e marchas populares. Em outubro, as festas de Nossa Senhora do Rosário traziam procissões e quermesses, onde montávamos barracas de rifas e vendíamos bolo-rei, empadas e vinho verde. Cada evento reforçava o tecido social e permitia que nos sentíssemos menos estrangeiros e mais guardiães de um legado que florescia em pleno Vale do Silício.
Assim, entre danças, missas e torneios, construímos uma nova casa em Santa Clara — não apenas o apartamento que nos acolhera, mas um espaço de pertença ampliado a todos que, como nós, carregavam no coração a terra vermelha de Santa Comba e as tradições portuguesas que nos definem.
5. Reflexão e Continuidade
Ao longo desta jornada, percebemos que o exílio forçado moldou uma identidade resiliente, sustentada por redes comunitárias e pela transmissão intergeracional de memórias e tradições que transcendem fronteiras geográficas Portal Diplomatico. A experiência dos “retornados” de Angola ensinou-nos que a pátria se constrói também com o trabalho coletivo em novas terras, alicerçado em instituições de apoio e celebração da cultura lusófona Gallery of the Portuguese Pioneers. No Vale do Silício, a consolidação de clubes sociais, museus e festivais portugueses transformou a saudade em motor de coesão e renovação cultural Wikipedia. A contínua adaptação mostrou que a diáspora não é apenas fuga do passado, mas diálogo vivo entre quem parte e quem chega, onde o legado de Santa Comba encontra novos caminhos em cada geração Taylor & Francis Online.
5.1 Lições da Diáspora
A diáspora luso-angolana demonstrou que comunidades dispersas podem criar sociedades de apoio mútuo, alavancando associações religiosas e culturais para enfrentar desafios de integração Portal Diplomatico. Instituições como a POSSO e o Portuguese American Community Center exemplificam como organizações de base fortalecem laços sociais e oferecem recursos para recém-chegados . A preservação do idioma e das tradições, por meio de aulas de língua, festas do Divino Espírito Santo e celebrações do Dia de Portugal, reforçou o sentimento de pertença mesmo longe da terra natal Portugal News. As histórias de sucesso e solidariedade publicadas em fanzines e museus comunitários comprovam que o conhecimento compartilhado é ferramenta poderosa de empoderamento Portuguese Museum.
5.2 Preservação Cultural no Vale do Silício
Em Little Portugal, em San José, o Five Wounds Portuguese National Church e o SES Hall mantêm vivas danças folclóricas açorianas e cantares tradicionais, promovendo intercâmbio entre jovens e idosos Wikipedia. O Portuguese Historical Museum preserva artefactos e histórias dos impérios do Espírito Santo, contextualizando a presença lusitana desde o início do século XX Portuguese Museum. Restaurantes e padarias portuguesas, como o Popular Bakery, funcionam como pontos de encontro onde sabores de pão caseiro e pastel de nata evocam memórias de Santa Comba Wikipedia. Clubes desportivos, como o Casa do Benfica e a Sociedade Filarmónica União Popular, promovem torneios e eventos musicais que unem gerações em torno de tradições luso-americanas Wikipedia.
5.3 Impacto nas Gerações Futuras
Estudos sobre transmissão intergeracional indicam que memórias de trauma e resiliência são incorporadas pelas gerações seguintes, moldando identidades híbridas e fortalecendo a coesão comunitária Oxford Academic. As crianças que cresceram ouvindo histórias da “mata” e dos “camiões de carga” desenvolveram um orgulho dual luso-angolano, refletido em atividades escolares e em clubes culturais SpringerLink. A participação ativa de netos em festas, coros e projetos educativos, como oficinas de música tradicional, assegura a continuidade do legado, transformando a saudade num vínculo criativo e inclusivo Russell Rosario. Deste modo, as memórias de Santa Comba continuam vivas em cada verso, cada dança e cada conversa em português europeu, garantindo que o sonho de regresso se mantenha presente, mesmo a milhares de quilómetros de distância facebook.com.
6. Conclusão e Visão
Ao longo desta crónica, testemunhámos como a trajectória dos “retornados” de Angola — do desbravar da mata em Santa Comba ao acolhimento em comunidades luso-americanas no Vale do Silício — ilustra a força transformadora da memória, da cultura e da solidariedade comunitária. Aprendemos que a identidade luso-angolana se redefiniu no exílio, apoiada por redes formais (POSSO, SES Hall, Portuguese American Community Center) e informais (família, vizinhos), e que essa coesão foi essencial para a integração em terras estrangeiras. Reconhecemos o papel das celebrações religiosas, dos clubes culturais e universitários na preservação de tradições, bem como a importância da transmissão intergeracional de memórias traumáticas e resilientes. O futuro da diáspora depende agora da capacidade de inovar em âmbitos digitais, de reforçar a participação cívica e de fomentar parcerias com Angola e Portugal, garantindo que as próximas gerações continuem a sonhar com o regresso e a edificar pontes entre continentes.
6.1 Síntese das Lições
A experiência das comunidades portuguesas na Califórnia demonstra que a união em torno de centros culturais fundamenta a integração e preservação identitária UC Berkeley Library. A missão da diáspora angolana, embora ainda careça de estruturas oficiais de apoio e registos de competências, sublinha a necessidade de organização e baseia-se na mobilização de voluntários e familiares Diaspora for Development. Associar tradição e inovação — como no caso dos Congressos da Luso-American Education Foundation — fortalece laços transnacionais e educacionais Novidades - The Islands and the Diaspora.
6.2 Perspectiva para o Futuro da Diáspora Luso-Angolana
A construção de identidades híbridas depende de espaços de encontro que integrem luso-angolanos e descendentes em diálogos culturais e económicos. Projetos de investigação sobre mobilidade transnacional revelam o potencial de transferência de conhecimento e investimentos em Angola PMC. A resiliência demonstrada em outras diásporas, como a judaica, oferece pistas sobre fatores que promovem a adaptação e o bem-estar comunitário — redes de suporte, práticas compartilhadas e liderança local Frontiers.
6.3 Chamado à Ação Cultural e Comunitária
Fortalecer Organizações Diaspóricas: Inspirar-se no modelo do Portuguese Diaspora Council para criar conselhos locais que articulem propostas de educação, emprego e relações Angola-Portugal Conselho da Diáspora Portuguesa.
Documentar e Partilhar Memórias: Ampliar iniciativas de oral history (Berkeley Oral History Center) e fanzines digitais, integrando metodologias académicas e comunitárias para registar testemunhos antes que se percam UC Berkeley Library.
Promover a Transmissão Intergeracional: Adotar práticas pedagógicas que combinem língua europeia e línguas angolanas, como quimbundo, e encorajar projetos escolares de dual-heritage SpringerLink.
Inovar em Plataformas Digitais: Utilizar redes sociais, podcasts e museus virtuais para aproximar dispersos, inspirando-se em tipologias de organizações estudadas pela literatura recente sobre associações migrantes SpringerLink.
Fomentar Parcerias Académicas: Estabelecer colaborações com universidades e institutos de Angola e Portugal para programas de intercâmbio, investigação conjunta e desenvolvimento de políticas de migração IJASS Journal.
Este plano de ação visa não só preservar a rica herança luso-angolana, mas também potenciar um diálogo criativo e sustentável entre continentes, garantindo que as memórias de Santa Comba floresçam em novas gerações e que o sonho de regresso continue a inspirar futuros capítulos desta história coletiva.
